VIDA SELVAGEM: IMPORTÂNCIA E PROTEÇÃO

ANTÔNIO SILVEIRA RIBEIRO DOS SANTOS
Juiz de direito em São Paulo. Criador do Programa Ambiental: A Última Arca de Noé (www.aultimaarcadenoe.com)


I – Vida selvagem, conceito
Ultimamente tem-se falado muito em preservação dos recursos naturais principalmente em países emergentes como o Brasil, onde ainda existem grandes extensões de florestas como ocorre na Amazônia. Por outro lado, sabe-se que os recursos naturais como a cobertura florestal são importantes para a economia dos países possuidores, daí a dificuldade em mantê-los intactos ou preservados, notadamente porque a grande maioria das nações do globo não os têm mais e são justamente as mais ricas, o que torna a pressão sobre os mais pobres cada vez maior.
Os recursos naturais podem ser divididos a grosso modo em recursos minerais, hídricos, botânicos e faunísticos. Minerais são os recursos advindos da exploração dos minerais como ferro, cobre, granito, mármore, cal etc. Recursos hídricos são os provenientes das águas como obtenção de água potável, irrigação, geração de energia etc. Recursos botânicos são os que vêm da exploração da flora, como extração da madeira, frutos e dos potenciais farmacológicos das plantas medicinais. Já os recursos faunísticos são os gerados pela fauna, através da caça e pesca autorizadas, criação de animais silvestres para consumo etc.
Interessa-nos discutir aqui a questão da vida selvagem, sua conceituação, importância como recurso natural e proteção. Pois vejamos.
Pode-se dizer que a vida selvagem de uma região é o conjunto dos seres vivos – animais e plantas, que possuem capacidade de sobreviver e procriar livremente na natureza. Por suas características mais dinâmica, os animais chamam mais atenção, de forma que serão nosso objeto no estudo da vida selvagem. Portanto, os animais que vivem em estado selvagem são elementos que formam a vida selvagem, compondo a fauna local, a qual consiste no conjunto dos animais que vivem em uma determinada área. Segundo o evolucionista Ernst Mayr fauna é em estrito senso “a totalidade de espécies na área” -is the totality of especies in the area, e em lato senso “as espécies animais encontradas em uma área como resultado da história da área e suas condições ecológicas presentes” – the kinds of animals found in a area as a result of the history of the area and its present ecological conditions (Evolution and Diversity. Selected essays of life. Harward University Press. Engelad, p.563).
A fauna pode ser doméstica ou seja compreende os animais domesticados pelo homem e selvagem que são os animais selváticos, isto é , os animais que vivem em estado selvagem, ou seja os que não dependem do homem para sobreviver e procriar, os que vivem livres em seu habitat.

II – Importância
Conceituada a vida selvagem, passamos a indagar o seguinte: qual a sua importância? Para que serve finalmente? É o que vamos tentar responder.
Como se sabe, a fauna silvestre tem importância fundamental no equilíbrio dos ecossistemas em geral, pois muitos animais são vitais à existência de muitas plantas, pois se constituem no elo de procriação já que são seus agentes polinizadores, como no caso dos beija-flores, insetos como borboletas, besouros etc. Além disso, muitos são dispersores de sementes que necessitam passar por seu trato intestinal, como muitos mamíferos, sem contar que praticamente todos o animais são excelentes agentes adubadores. Também tem sua importância na cadeia alimentar. Dessa forma a fauna tem importância primordial na existência e desenvolvimento das áreas naturais, o que vale dizer ainda que são produtores indiretos dos benefícios econômicos que a exploração da madeira, frutas, resinas florestais, entre outros, podem proporcionar aos homem.
Ademais, não podemos esquecer que o reino animal e o reino vegetal formam uma fina camada na superfície da terra, conhecida como biosfera, regida por rigorosas leis fisiológicas que em harmonia permitem a sobrevivência das espécies. Quebrar esta harmonia abruptamente pela interferência humana fará com que milhões de espécies entrem em processo de extinção, resultando a médio e longo prazo a própria extinção da espécie humana; de sorte que a manutenção da vida selvagem e da flora natural é primordial para a manutenção da vida global.
Em termos de alimentação, como é sabido, a fauna silvestre é importantíssima, pois foi primordial à raça humana que dependia dela para sobreviver. A caça foi a forma rudimentar utilizada por nossos ancestrais para a obtenção de alimento. Ainda é para muitas tribos indígenas que vivem isoladas na Amazônia. O manejo da fauna silvestre também poderá ser muito importante para o homem dito civilizado, o qual poderá manter e desenvolver criação de animais silvestres para fins de obtenção de proteína. Cada dia que passa os conhecimentos científicos adquiridos nesta área possibilitam um melhor desenvolvimento desta atividade, o que poderá resultar em uma grande diversidade de espécies utilizáveis, melhorando a quantidade e qualidade da produção, complementando os produtos extraídos dos animais domésticos, através da biotecnologia e da utilização da engenharia genética.
A manutenção da fauna silvestre, conseqüentemente da vida selvagem, também possibilita a sua exploração turística, pois a cada ano cresce o número de pessoas que procuram os parques naturais para ver os animais selvagens. Só de “birdwatchers” -que são aqueles que observam os pássaros, estima-se que existam mais de 80 milhões, o que representam um potencial econômico importantíssimo, pois necessitam usar hotéis e o comércio próximo às áreas de observação, gerando assim enormes receitas. Sem contar a pesca para alimentação em áreas naturais que também gera milhões de dólares em todo o mundo. Além desse aspecto, a pesca esportiva pode se tornar enorme fonte de renda para o Estado por meio de impostos e para milhões de pessoas ou empresas ligadas direta ou indiretamente a ela. Nos EUA por exemplo, este esporte transformou-se em uma indústria com faturamento anual direto em torno de US$60 bilhões e faz parte do sistema de preservação dos parques naturais através da sua organizadora a Fish and Wildlife Service. Sem contar a possibilidade de exploração turística da pesca esportiva.
Em termos educacionais, a manutenção da vida selvagem também é muito importante, pois possibilita aos jovens o contato com os animais selvagens passando assim a conhecer a vida em seu esplendor primitivo, permitindo que se tirem lições de vida e comportamentais através de sua observação atenta.
Quanto a caça, em termos econômicos não se pode esconder que vem rendendo muitas divisas em alguns países, mas o tema é muito polêmico, pois alguns países como o Brasil ela não é permite a não ser em algumas exceções.
Outra importância da manutenção da vida selvagem através de parques e reservas naturais é a possibilidade de fornecer às pessoas locais de grande beleza plástica e cênica, o que valoriza a condição de vida de todos os que tem acesso a ela.

III – Proteção
Pelo exposto, percebe-se que a vida selvagem tem primordial importância no contexto global da terra e influência substancial para o ser humano, tanto biológica como economicamente, de forma que sua proteção é fundamental. Mas, como protegê-la? É o que tentaremos propor.
A proteção da fauna e flora pode e deve ser feita através de medidas administrativas e legais. A forma administrativa é feita através da criação de unidades de conservação pelo Poder Público como parques nacionais, estaduais e municipais, estações ecológicas, florestas naturais, refúgios da vida selvagem, APAs- Áreas de Proteção Ambiental, Reservas da Biosfera etc. O particular também poderá criar áreas de proteção constituindo Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs), autorizadas pelo Decreto federal 1.922, de 5 de junho de 1996.
Há ainda as regras contidas nas convenções internacionais que são adotadas por muitos países, como a Convenção de RAMSAR sobre as zonas úmidas de importância internacional, especialmente como habitat de aves aquáticas, a Convenção sobre o comércio internacional das espécies da fauna e flora selvagem em perigo de extinção, conhecida como CITES, onde relaciona os animais e plantas em perigo de extinção e regulamenta o seu comércio internacional, só para citar algumas.
Em relação a legislação propriamente dita, no Brasil há muitas leis protetoras da fauna e flora, pois vejamos. O art.1º da Lei 5.197/67, protege os animais selvagens, considerando como tais os que vivem naturalmente fora do cativeiro. Entende-se também que a fauna silvestre é um bem público de uso comum do povo. Neste sentido, ensina o festejado Hely L.Meirelles quando diz em suma que a fauna, fica sob o domínio eminente da Nação e se sujeita a um regime administrativo especial, visando a sua preservação, como riqueza nacional que é (Direito administrativo brasileiro, Malheiros Editora, 22ªed. 1997,p.486). Já a Constituição Federal diz que compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre a fauna (art.24,VI). Determina também que o Poder Público proteja a fauna e a flora, ficando proibido práticas que coloquem em risco a sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam animais à crueldade (art.225). A proteção da fauna ictiológica (peixes) é regulamentada principalmente pelo Decreto-lei 221, de 28.2.67, conhecido como Código de Pesca, o qual não protege apenas os peixes mas é mais amplo pois protege “todos os elementos animais ou vegetais que tenham na água seu normal ou freqüente meio de vida (art.1º). A Lei 7.643, de 18.12.87, proíbe a pesca de cetáceos em águas brasileiras. A nova lei dos crimes ambientais (Lei 9.605/98) regula também os crimes contra a fauna (art.29 ao art.37) e contra a flora (art. 38 ao art.53). Ou seja, há legislação suficiente para proteger a fauna e flora silvestres e conseqüentemente a vida selvagem.
Por último é importante lembrar que, por se constituírem bens de propriedade do Estado, de domínio público ao mesmo tempo que bens ambientais legalmente protegidos, tanto a fauna quanto a flora silvestre, por extensão a vida selvagem como um todo, podem ser protegidos através da ação civil pública regulamentada pela Lei 7.347/85. O Ministério Público e as entidades que preencham os requisitos ali relacionados podem e devem propor a aplicação da legislação protetiva pertinente em havendo algum dano ou ameaça de dano aos citados bens.

IV – Conclusão
Ante o exposto, podemos concluir que a vida selvagem que se compõe da fauna e da flora nativas, tem importância vital para a manutenção da biosfera da terra e conseqüentemente para o ser humano e sua preservação é primordial para mantermos a qualidade de vida do planeta, bem como a própria vida no planeta. Além do que ela pode gerar múltiplos benefícios como alimentares, econômicos, educacionais e de laser, de maneira que deve ser protegida pelo Poder Público e pela coletividade, para que possamos ter um meio ambiente equilibrado e sadio, por sinal um direito de todos, nos termos do art.225 da Constituição Federal.
Fora isso, o surgimento da vida selvagem confunde-se com o surgimento da Terra, de maneira que não cabe ao ser humano como uma das espécies mais novas destruí-la em dois ou três mil anos, tempo ínfimo em termos geológicos. Aliás, é oportuno lembrar o biólogo Jean Dorst quando diz que “não temos o direito de exterminar o que não criamos. Um humilde vegetal, um inseto minúsculo contêm mais esplendores e mais mistério do que a mais maravilhosa das nossas construções (Antes que a natureza morra. Ed. E. Blücher Ltda. 1973, p.383). Também é relevante e ilustrativo lembrarmos o pensamento de Edwad O. Wilson neste sentido quando diz que “devemos considerar cada partícula de biodiversidade inestimável, insubstituível, enquanto aprendemos a usá-la e a compreender o que significa para a humanidade (Diversidade da Vida. Ed. Companhia das Letras.1994,p.377)
Por derradeiro, pode-se concluir ainda que, só haverá vida selvagem em determinada região se houver fauna selvagem em sintonia com a flora selvagem, de maneira que a preservação das áreas naturais florestadas é de suma importância para a sua manutenção, devendo ser por tudo isso um dos objetivos da humanidade neste século XXI.

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