Estudos de Direito Urbanístico
Definição
O Direito Urbanístico está intrinsecamente ligado às questões relacionadas ao meio ambiente, pois trata de diretrizes que visam ordenar os conglomerados humanos para possibilitar uma vida comunitária saudável. Nesse sentido o meio ambiente sadio deve ser observado no Direito Urbanístico.
Daí porque a colocação deste tema em um programa que visa a educação ambiental global.
O novo direito urbanístico possui várias definições, como:
– “o Direito Urbanístico Objetivo consiste no conjunto de normas que tem por objetivo organizar os espaços habitáveis, de modo a propiciar melhores condições de vida ao homem na comunidade” e “Direito Urbanístico como ciência é o ramo do direito público que tem por objeto expor, interpretar e sistematizar as normas e princípios disciplinadores dos espaços habitáveis” (José Afonso da Silva. Direito Urbanístico Brasileiro. 2ª ed. rev. atual. 2ª tiragem. Malheiros. São Paulo: 1997. p. 42);
– “o direito urbanístico trata de aspectos fundamentais para o bem-estar das pessoas, que são os relativos ao meio ambiente construído” . (Victor Carvalho Pinto. Notas Introdutórias ao Direito Urbanístico, Ministério Público do Estado de São Paulo. Temas de Direito Urbanístico. Caohurb. São Paulo: 1999. p. 145);
– já, nossa definição para direito urbanístico é ” o ramo do Direito que regula a atividade estatal concernente à ordenação dos espaços habitáveis no meio ambiente urbano”.
Objetivos principais do direito urbanístico:
– disciplinar o ordenamento urbano;
– disciplinar o uso e ocupação do solo urbano;
– criar e disciplinar áreas de interesse especial;
– coordenar a ordenação urbanística da atividade edilícia;
– coordenar a utilização de instrumentos de intervenção urbanística.
Os princípios do direito urbanístico são:
– Princípio do urbanismo como função pública;
– Princípio da conformação da propriedade urbana;
– Princípio da harmonia das norma urbanísticas;
– Princípio da afetação;
– Princípio da justa distribuição dos benefícios e ônus derivados da atuação urbanística.
Dentre as instituições do direito urbanístico ressaltam-se:
– planejamento urbanístico;
– parcelamento do solo urbano urbano ou urbanizável;
– zoneamento do uso de solo;
– ocupação do solo;
– reparcelamento
Propriedade e solo urbanos
Tem-se no art. 5º, incs. XXII e XXIII, da Constituição Federal que é garantido o direito de propriedade, e que esta atenderá a sua função social.
Assim, as limitações administrativas impostas pelo Poder Público, com seu poder de polícia, encontram escopo no artigo constitucional supra-mencionado. Do mesmo modo as limitações da propriedade urbana, que deverá albergar interesses privativos do seu titular e interesses públicos e sociais.
Plano diretor
O plano diretor pode ser definido como o conjunto de normas que fixa as diretrizes urbanísticas e de utilização do solo de determinada cidade.
No plano diretor são estabelecidos os objetivos, prazos, atividades, competências para executar as suas normas, bem como há fixação das diretrizes de desenvolvimento. Sua elaboração é de competência do Executivo Municipal, por intermédio dos órgãos de planejamento da Prefeitura, e são aprovados por lei.
Etapas da elaboração do plano diretor:
– Estudos preliminares;
– Diagnóstico;
– Plano de diretrizes;
– Instrumentação do plano.
Função do plano diretor:
– sistematizar o desenvolvimento físico;
– sistematizar o desenvolvimento econômico;
– sistematizar o desenvolvimento social do território.
Objetivos principais do plano diretor, como:
– promover a ordenação dos espaços habitáveis;
– reurbanização de bairros;
– alargamento de vias públicas;
– construção de vias expressas;
– ordenar os espaços destinados às industrias;
– ordenar a construção de casas populares;
– ordenar a distribuição de redes de esgotos;
– o saneamento;
– retificação um rios e urbanização de suas margens;
– o zoneamento;
– o arruamento;
– os loteamentos.
Segundo o artigo 182 da Constituição Federal, a política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público Municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.
Ainda nesse mesmo artigo, em seu § 1º, temos que o plano diretor, que será aprovado pela Câmara Municipal, e que é obrigatório nas cidades com mais de 20 mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana e a propriedade urbana cumprirá sua função social quando atender às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.
– Solo criado
Como define José Afonso da Silva (in Direito Urbanístico Brasileiro. 2ª ed. rev. atual. 2ª tiragem. Malheiros. São Paulo: 1997), solo criado são os solos edificáveis artificiais, suportados pelos solos naturais dos lotes, abrigando seu conceito quatro mecanismos básicos: 1. coeficiente de aproveitamento único; 2. vinculação a um sistema de zoneamento rigoroso; 3. transferência do direito de construir; 4. proporcionalidade entre solos públicos e solos privados.
Conforme ainda presente na Carta de Embu (apud obra cit.), solo criado será toda edificação acima do coeficiente único, quer envolva ocupação de espaço aéreo, quer a de subsolo.
– Tombamento
Definição: O instituto do tombamento pode ser definido como o procedimento pelo qual o Poder Público impõe ao proprietário particular ou público de bem de valor comprovadamente de interesse cultural em geral, restrições administrativas visando a sua preservação e proteção.
Base legal: Decreto-lei federal nº25 de 30.11.1937.
Finalidade: sua finalidade é conservar a coisa ou conjunto de coisas tidas como de valor cultural, com a suas características originais.
Deve-se lembrar que o proprietário não perde a sua propriedade, apenas lhe é retirado o direito de transformá-las, demoli-las ou desnaturá-las. Para repará-las, pintá-las ou restaurá-las necessitará o proprietário de autorização do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN (art.17).
Patrimônio cultural e tombamento
As conseqüentes ações e manifestações da educação e da cultura podem se expressar em bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, que portam referências à identidade, ação ou memória dos grupos que formam a sociedade constituem o patrimônio cultural brasileiro (art. 216, Constituição Federal).
Incluem-se entre estes bens: as formas de expressão; os modos de criar, fazer e viver; as criações científicas, artísticas e tecnológicas; as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico (incisos I,II,III,IV e V, do referido artigo).
Nos termos do art. 32 da Constituição Federal, os Municípios juntamente com a União, Estados e o Distrito Federal têm competência comum para, entre outras, proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis os sítios arqueológicos (III).
Cabe também aos municípios legislar sobre assuntos de seu interesse local e promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a ação fiscalizadora federal e estadual (art.30, I e IX, Const. Federal); porém, por ter o patrimônio cultural brasileiro esta amplitude e extensão a sua promoção e proteção tornam-se difíceis, daí porque não deve ficar apenas nas iniciativas do Poder Público.
Para protegê-lo a legislação prevê várias formas ou procedimentos, entre eles o tombamento. Aliás, esta é uma das formas mais utilizadas na proteção de conjuntos urbanos, vide Paraty, Ouro Preto o centro de Salvador etc.
Deve-se observar que a decisão administrativa de tombamento poderá ser objeto de discussão na esfera do Judiciário, pois não se pode excluir da apreciação do Poder Judiciário nenhuma lesão ou ameaça a direito (art.5º, XXV, Const. Federal), o que propicia a discussão com a sociedade do processo de tombamento. Os munícipes e os municípios podem ainda proteger juridicamente o patrimônio cultural através da ação civil pública prevista na Lei 7.347/85, que rege as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados, entre outros aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, ou ainda obrigar ao Poder Público preservar um bem patrimonial como um conjunto urbano que preencha os requisitos legais, independentemente dele estar tombado ou não.
Função ambiental da propriedade
O proprietário tem o direito de usar e dispor de seus bens e de reavê-los do poder de quem quer que injustamente os possua (art.524, Cód.Civil); o que a princípio leva a crer que há um direito absoluto de utilização, mas não é assim.
Sabemos que o direito não é absoluto, pois quando o seu exercício passa a incomodar terceiros esbarra no direito alheio, ante o seu caráter bilateral, não fugindo a regra o direito de propriedade, pois o uso normal da propriedade implica em não extrapolar os seus limites, havendo hodiernamente restrições a sua utilização, as quais podemos dividir principalmente em administrativas, cíveis e ambientais.
No âmbito administrativo as restrições são aquelas impostas pelo Poder Público no exercício de seu poder de polícia, o qual pode ser muito amplo, observando que Hely Lopes Meirelles, cita entre outros poderes a : policia sanitária, polícia das construções, polícia das águas, polícia da atmosfera, polícia das plantas e animais nocivos, polícias dos logradores públicos, polícia de costumes, polícia de pesos e medidas e polícia das atividades urbanas em geral (Direito Municipal Brasileiro, ed.Rev.dos Tribunais, 4ªed.). Portanto, a propriedade deve obedecer inúmeras normas e posturas administrativas para garantia do bem estar público.
Na esfera cível, propriamente dita, encontramos os limites impostos pela função social da propriedade (art.5º, XXIII da Constituição Federal), sendo certo que esta função não traz uma limitação concreta, mas representa uma utilidade da propriedade, que cada vez mais tem que ser util, mormente pelo fato do crescimento da pobreza devido ao mal gerenciamento administrativo que ocorre há décadas, gerando contingentes de desabrigados e, conseqüentemente, grandes movimentos populares com objetivos de assentamentos, forçando assim a mudança da compreensão da amplitude do conceito de propriedade.
Ainda temos no âmbito civil as restrições referentes a vizinhança, nos termos do art.554 do Código Civil, que dá ao proprietário o direito de impedir o mal uso da propriedade vizinha que venha prejudicar a segurança, o sossego e a saúde, podendo exigir a demolição ou reparação mediante ação cominatória ou indenizatória (art.555) . Já o art.572 limita o direito do proprietário de construir em vista do direito dos vizinhos e dos regulamentos administrativos, podendo ser embargada a obra (art.573), lembrando que a definição de vizinhança é mais ampla do que parece, considerado-se vizinho todo aquele que venha a sofrer danos pelos atos de abuso do proprietário, não abrangendo apenas prédios confinantes, pois atos de poluição sonora ou atmosférica, por exemplo, podem atingir grandes distâncias.
Em relação a questão ambiental, que mais nos interessa aqui, o direito de propriedade sofre restrições em virtude das instituições, por exemplo, de áreas de preservação como dos Parques Nacionais e Estações Ecológicas, do disposto no art.1ºdo Cód.Florestal (Lei 4771, 15/09/65) e da constituição da Reserva Legal obrigatória nos imóveis urbanos (arts.16 e 44 Cód. Florestal); restrições estas que impõem limitações ao exercício do direito de propriedade em vista da preservação das florestas, as quais são consideradas bens de interesse comum a todos.
Além disso, todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, sendo portanto reconhecido o direito a se ter um meio ambiente sadio (art.225 da Const.Federal), que não pode ser prejudicado por atos poluentes ou abusivos de proprietários irresponsáveis.
Assim, conclui-se que atualmente o direito de propriedade não é absoluto, devendo o proprietário utiliza-lo de forma a atender os fins sociais, não prejudicando terceiros, bem como não produzindo nenhuma ação poluidora que afete o seu vizinho ou a coletividade, obedecendo ainda as restrições e imposições de caráter ambiental, uma vez que o direito a um ambiente sadio é previsto constitucionalmente, redundando aí uma clara necessidade da propriedade observar também a sua função ambiental.
por Antonio Silveira