DIREITOS HUMANOS E MEIO AMBIENTE

Introdução
Como sabemos os direitos humanos apareceram concretamente no  cenário mundial com a Revolução Francesa em 1789, tendo sido uma conquista alicerçada nos movimentos de preservação das garantias individuais, onde se destacaram as obras de Rousseau.
Posteriormente com a Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU de 1948 ficou reconhecida a necessidade de que os países deveriam observa-los e as regras deste importantíssimo documento passaram a dar subsídios às futuras discussões sobre a questão.
Já a II Conferência Mundial de Direitos Humanos, 1993, Viena,   sedimentou em caráter universal a necessidade de observação e preservação dos direitos humanos, onde se concluiu que é necessário seja reafirmado o compromisso e responsabilidade de todos os Estados de promover o respeito universal e proteção de todos os direitos humanos, seja promovida a autodeterminação dos povos; reafirmado o direito ao desenvolvimento como parte integrante dos direitos humanos universais, bem como propugna pela cooperação dos Estados com as ONGs para garantia efetiva dos direitos humanos, define a extrema pobreza como inibidora do pleno exercício dos direitos humanos, solicita o fim do apartheid, propugna a observação dos direitos humanos das mulheres, crianças e minorias étnicas. Recomenda a ratificação e adesão dos tratados internacionais de direitos humanos, solicita seja elaborada uma declaração efetiva sobre os direitos dos povos indígenas e propõe que o desenvolvimento deve satisfazer as necessidade ambientais para garantir a sobrevivência das gerações futuras, entre outros. (Instrumentos Internacionais de Proteção dos Direitos Humanos. Procuradoria Geral do Estado/SP. Centro de Estudos. Série Documentos nº14.1996, pg. 61/99). Nesta última recomendação referida vê-se que as questões ambientais devem ser observadas nos caminhos do nosso desenvolvimento, mostrando desde aquela época a preocupação com esta temática.
Neste sentido é importante observar ainda que o art. III citada Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) diz que toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal. Ora, quando diz “`a vida” incluído está o meio ambiente equilibrado, pois este é uma das condições essenciais à existência da vida em toda a sua plenitude e formas.

Legislação brasileira
No que diz respeito a nossa legislação podemos destacar a própria Constituição Federal de 1988, onde existem importantes artigos referentes aos direitos humanos como:
– art.1º, inc.III, protege a dignidade humana e a coloca como fundamento da República;
– art.3º, inc.III, põe como objetivos fundamentais, entre outros, a erradicação da pobreza e da marginalização a fim de reduzir a desigualdade social e regional;
– art.5º, caput, coloca todos iguais perante a lei, e seu inciso III, que proíbe a tortura, o tratamento desumano ou degradante;
– art.6º determinada a assistência aos desamparados;
– art.193, dá como base da ordem social o bem estar e a justiça social;
– art.231, reconhece aos índios sua organização social como um todo,
– art.225 que reconhece o direito de todos a ter um meio ambiente equilibrado e sadio.

Dignidade humana
Quando se fala em direitos humanos, é oportuno discorrer sobre um dos seus pilares mais importantes é que o respeito a dignidade.
Dignidade vem do latim dignitate e pode ser definida como honradez, honra, nobreza, decência, respeito a si próprio (O Novo Dicionário Aurélio e Mini-dicionário Aurélio, ambos da Editora Nova Fronteira) e está ligada ao ser humano por uma abstração intelectual representativa de um estado de espírito.
A dignidade, por conseguinte, é um atributo humano sentido e criado pelo homem e por ele desenvolvido e estudado, existindo desde os primórdios da humanidade mas só nos últimos dois séculos percebidos plenamente, apesar de que quando o ser humano começou a viver em sociedades rudimentarmente organizadas a honra, honradez e nobreza já eram respeitadas pelos membros do grupo,  o que não era percebido e entendido concretamente, mas geravam destaque a alguns membros.
No correr dos séculos com o crescimento desordenado das populações humanas e seus inventos, os quais originaram guerras de dominação, surgiram os povos dominantes e os dominados em grande escalas:  os livres e os escravos. O homem passou a dominar outros homens, sobrepujando-se reciprocamente.  Então a dignidade humana respeitada naturalmente pelas sociedades mais rudimentares passou a ser desrespeitada e aviltada, impondo aos oprimidos e escravizados as mais indignas situações com a degradação de suas culturas, a negação de sua liberdade, desnorteando-os para a vida, o que podemos observar na catastrófica destruição das etnias ameríndias com a descoberta do Novo Mundo pelos europeus.
A dignidade humana nunca foi tão aviltada como nesta época dos ” grandes conquistadores ” , pois civilizações inteiras que viviam livres em suas terras foram humilhadas, aniquiladas ou escravizadas, isso tudo sem contar a vergonha da escravidão negra quando milhões de homens do continente africano tiveram sua dignidade totalmente desrespeitada pelos dominantes, apesar de se rebelarem bravamente por séculos, conforme registra Clóvis Moura (Rebeldia das Senzalas, Editora Mercado Aberto, 1988, RJ).
Portanto, a dignidade humana foi desrespeitada por todo o nosso “mundo civilizado”, apesar de homens com grande visão humanista como Rousseau  e Joaquim Nabuco, entre outros, levantarem suas vozes contra esta condição humilhante. Por seus escritos e ensaios filosóficos levaram e levam a sociedade humana a raciocinar sobre este grande problema social.
O ser humano como ser histórico que é cria seu mundo a sua volta e seus valores como a liberdade, sendo esta afeta a todos desde o mais rico ao mais pobre, pois faz parte de sua natureza: a natureza humana.
Tendo como denominador comum a liberdade e conseqüentemente o respeito a ela, as sociedades humanas devem ser constituídas e organizadas sobre o reconhecimento deste anseio mundial; devem formar uma sociedade ” humanizada” , observando  este valor intrínseco do homem. A dignidade só é possível com a liberdade, porque somente o homem livre é digno, pois terá reconhecida sua honradez, a sua nobreza de ser humano. Mas para que possa haver uma humanização total e abrangente, devem todas as organizações sociais humanas reconhecer seus membros por seus atributos intrínsecos humanos, e não pelos seus atributos materiais externos como riqueza material.
Como sabemos, não há mais a escravidão clássica que é a subjugação total do homem pelo homem com a repugnante transformação do ser humano em objeto passível de propriedade de outro, mas temos ainda a degradante desigualdade social com a existência de classes dominantes e classes dominadas, bem como pessoas dominantes e pessoas dominadas pela tecnologia, economia etc, gerando um vasto desnível social.
Se compararmos os séculos passados a situação humana melhorou, evidentemente, mas ainda há uma grande opressão à dignidade humana, pela dificuldade das pessoas terem oportunidades de melhoria de suas condições de vida e mesmo de poderem obter o mínimo de dignidade, mormente pela grande distinção de classes em decorrência do descontrole  econômico.
Como bem salientado por Manfredo A. de Oliveira (Ética e racionalidade moderna, Ed.Loyola, pg.110/111), é indispensável que haja uma elevação da consciência individual, da consciência universal, se quisermos ter uma sociedade universalmente livre. Não se trata de ideologia política ou partidária, mas se quisermos ser realmente humanos em toda a plenitude da palavra devemos repensar os nossos valores e elevar o respeito à nossa dignidade ao máximo, e assim estudar e pôr em prática uma nova organização social. Reorganizar a nossa sociedade tendo como  pilares a Justiça Social e o respeito ao direito à dignidade de todos os seus integrantes, observando e respeitando a liberdade individual e principalmente a consciência social de bem servir à causa comum.
Em nossa Constituição Federal encontramos importantes artigos nesse sentido como os acima citados que protegem a dignidade humana, direta ou indiretamente, de maneira que vemos em nossa Carta Magna amplos dispositivos legais que protegem a dignidade humana, faltando colocá-los realmente em prática. Finalmente podemos concluir que uma sociedade somente poderá existir plenamente se representar os anseios de todos os seus cidadãos e respeitar seus direitos fundamentais, incluindo aí o direito de se ter uma vida digna.

Ambiente equilibrado é direito fundamental humano
Como se vê nos dispositivos legais referidos, hoje em dia podemos incluir o meio ambiente saudável e equilibrado como um dos direitos fundamentais humanos, pois viver bem e em lugar saudável é um direito de todos; erradicar a pobreza e suas conseqüências ambientais também constitui-se em um direito humano, bem como o bem estar social que implica em um bem estar ambientalmente equilibrado é outro direito humano, assim como para se ter uma justiça social é necessário que todos os requisitos quanto ao meio ambiente sadio sejam observados. A dignidade humana está, ligada direta ou indiretamente à qualidade de vida e do ambiente sadio.
Porém, infelizmente temos visto ainda grandes violações dos Direitos Humanos no Brasil, incluindo aí a degradação do meio ambiente, o que tem repercutido negativamente no cenário mundial, mostrando que ainda temos um grande e difícil caminho a percorrer.
Entretanto, para que qualquer destes direitos sejam efetivamente observados e respeitados deve haver muita vontade política em âmbito internacional, regional e conscientização da problemática em questão.
Não podemos esquecer ainda que proteção dos direitos humanos é fundamental, sem o que estaremos fadados a viver na obscuridade de nossos instintos, com rompantes de egoísmo, violência e desrespeito aos mais fracos e ao meio ambiente.

Principais instrumentos internacionais de direitos humanos
– Carta da Nações Unidas: adotada em 26.06.1945 na Conferência de São Francisco. Ratificada pelo Brasil em 21.09.1945;
– Declaração Universal do Direitos Humanos: Resolução 217 A (III) da Assembléia Geral da ONU em 10.12.1948. Brasil assinou em 10.12.1948;
– Pacto Internacional do Direitos Civis e Políticos: Resolução 2.200-A (XXI) da Assembléia Geral da ONU em 16.12.1966. No Brasil, em 24.01.1992;
– Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais: Resolução 2.200-A (XXI) da Assembléia Geral da ONU em 16.12.1966. No Brasil em 24.01.1992;
– Convenção sobre a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes: Resolução 39/46 da Assembléia Geral da ONU em 10.12.1984. No Brasil em 28.09.1989;
– Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher: Resolução 34/180 da Assembléia Geral da ONU em 18.12.1979. No Brasil em 01.02.1984;
– Convenção sobre a eliminação de todas as formas de Discriminação Racial: Resolução 2.106-A (XX) da Assembléia Geral da ONU em 21.12.1965. No Brasil em 27.03.1968;
– Convenção sobre os Direitos das Crianças: Resolução L. 44 (XLIV) da Assembléia Geral da ONU em 20.11.1989. No Brasil em 24.09.1990.;
– Convenção Americana de Direitos Humanos: adotada em 22.11.1969 em São José da Costa Rica, na Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos. No Brasil em 25.09.1992;
– Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura: adotada em 09.12.1985 pela Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos. No Brasil em 20.07.1989;
– Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher: adotada em 06.06.1994 pela Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos. No Brasil em 27.11.1995.

O EMERGENTE DIREITO SOCIAL

Considerações
No processo evolutivo social do homem observamos que na antiguidade grega o povo recebia dos filósofos a doutrina e a moral, de forma que elas vinham prontas e eram impostas pelos pensadores. O que não se encontrava nos ensinamentos estava errado; havia uma subjugação do fato social às normas filosóficas.
Posteriormente a moral, a ética e os costumes sociais foram impostos pela religião, tendo todos os atos sociais que passar pelo crivo dos princípios religiosos; era a conduta social determinada pela religião ou a norma divina regendo a vida social.
Com Descartes é que o homem começou a ter consciência de si mesmo passando a raciocinar como ente universal e como indivíduo. Mais tarde os costumes, a moral e o pensamento passaram a ser entendidos como fatos relativos, variando conforme a sociedade e por tempo determinado, limitando-se às mudanças sociais, conforme Montesquieu e Rousseau, sendo que este último dá ao homem uma dimensão  pessoal ao mesmo tempo que social introduzindo a idéia de que o direito dos homens traz uma espécie de vontade geral  que é alicerçada no próprio Direito. O direito de cada homem traz uma parcela do direito coletivo e social que deve se impor ao direito de apenas alguns.
Após os humanistas citados cresceram em todo o mundo as ciências sociais como a Sociologia, a Psicologia etc, além do Direito, baseando-se principalmente  nessa nova convicção social do homem.O ser humano cria uma consciência do social, criando um mundo social com suas regras baseadas nos fatos sociais concretos, sendo essas regras ao mesmo tempo diretrizes abstratas e concretamente percebidas (metafísicas). É o fato social dando causa as regras sociais.
As ciências humanas desvincularam-se da filosofia passando a ter vida independente. A antropologia filosófica dá lugar a antropologia social que estuda o sistema do comportamento humano pelo prisma dos fatos sociais. Estes é que dirão as regras, as quais vem de dentro da sociedade e não de fora impondo condutas preestabelecidas. Então, sob esta nova visão social, modernamente o Direito começa a tomar conotações mais sociais. Há uma tendência a se observar as necessidades de todas as classes sociais, enquanto agrupamentos de pessoas das mesmas condições culturais e econômicas.

O homem social
Forma-se assim uma nova visão do homem: o homem social, tendo como base o direito de cada um, formando um conjunto solidário. Idéia esta sacramentada por Karl Marx que trouxe maior valorização dos aspectos sociais. É o “tudo pelo social” que vemos em muitas manifestações.
O Direito instituído, ou seja o direito vigente normativo começa a sofrer pressão da sociedade alijada de sua elaboração  que pretende impor a necessidade de elaboração de novas leis com aspectos mais amplos sociais, isso tudo devido ao grande distanciamento socioeconômico das classes existentes com o empobrecimento de milhões em relação ao enriquecimento de poucos, principalmente pela irresponsabilidade administrativa de muitos governantes e administradores da coisa pública no correr de décadas, sem contar a ação danosa da corrupção que grassou e grassa em nossa sociedade.

O direito social
Desse modo começa a surgir campo para um “Direito Social”, o qual tem suas bases fundamentais nos aspectos sociais da Nação, tendo como diretrizes a proteção efetiva dos direitos primordiais do ser humano como: a vida, a integridade física, a consciência, a liberdade etc.
Já há doutrinadores que fazem uma divisão classificatória dentro do Direito, distinguindo o direito instituído do direito insurgente, como M.Pressburger, citado por A.B.Betioli (Introdução ao Estudo do Direito, Ed.Letras & Letras, pg.321), sendo aquele o direito positivado e este tendo  como  base os anseios sociais não reconhecidos normativamente, visualizando-se uma dicotomia no Direito com grande evolução deste Direito Social emergente adaptando-se a nova ordem social.
As normas deste novo Direito passam a existir em função das necessidades sociais, mostrando cada vez mais esta realidade concreta social, não sendo mais apenas normas impostas por alguns poucos encarregados da sua elaboração, muitas vezes desvinculados dos anseios e necessidades sociais, como outrora. Seguindo essa tendência, as leis devem refletir cada vez mais as necessidades sociais; devem abranger os anseios de todos os cidadãos independentemente  da classe social.

Legislação social
No Brasil observamos grandes avanços nesta área, pois já há em nossa Constituição Federal muitas normas de carater social como: art.1º,  II, III e IV, que mostram como fundamentos do Estado democrático o direito a cidadania, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; art.3º,I, III e IV, que constituem como objetivos fundamentais da República a erradicação da pobreza e a redução da desigualdade social, bem como a promoção do bem comum e a proibição da discriminação; art.5º, que garante os direitos individuais; art.6º e 7º que dizem respeito aos direitos sociais, incluindo a proteção da saúde e do trabalhador assim como dos desamparados, e por último a proteção à organização social dos índios arts.231 e 232.

Conclusão
Portanto, a nossa legislação nos dá esperança de podermos implementar ações sociais cada vez mais direcionadas ao bem comum para a realização de uma justiça social concreta, propiciando o fortalecimento do emergente “Direito Social”, que tem como suporte uma nova era: a era social absoluta do homem.
Esta nova era tem relação direta com a questão ambiental, pois está inserido nos direito humanos como visto o direito à qualidade de vida, fazendo parte do social também.
De uma forma ou outra o social e ambiental, estão juntos e interligados.

por Antonio Silveira

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